quarta-feira, 25 de março de 2009

B-roken

O frio era intenso naquela tarde de Domingo.
Ao acordar, ela coloca o braço no outro lado da cama, lado esse que hoje estava vazio. Não sentindo nada, como de costume, ela abre os olhos devagar, observando o lugar vazio que lá estava. Um lado da cama estava quase arrumado, como se alguém tivesse arrumando após levantar. O susto de não vê-lo ao seu lado todos os dias a fez levantar. Seus olhos escuros viravam mel quando refletidos pela luz do sol. A pouca luz do dia lutava contra a cortina branca que cobria a janela do quarto. Ela o procura por toda casa e o que ela encontra era uma carta que dizia: “Quando é que você vai deixar o vento que sopra por entre seu cabelo ser mais do que brisa? Quando é que eu vou testemunhar por trás dos olhos algo mais do que sentimentos escondidos? Quero que um dia acordes como destinatária e, aí sim, me respondas, usando o verso que vires a escolher. E esses versos serão nossos para todo o sempre, pois somente nós conversamos assim. Somente nós desacreditamos tudo e lançamos a todos o mesmo olhar descrente e decepcionado. Esteja aqui quando eu gritar. Estava aqui quando eu precisar. Esteja aqui,e me faça continuar. Eu te amo.” E nem todo esforço que ela vir a fazer, seria capaz de parar as inúmeras lágrimas que caíam sobre seu rosto. E seria em vão. O vento forte fazia seu cabelo dançar. E não adianta dançar depois que a música parou. E nada lhe faria perder a atenção segurando aquela folha de papel. E são raríssimos momentos que estamos tão sozinhos a ponto de ouvir nossos batimentos cardíacos. Basta fechar os olhos. É na escuridão que ela tenta encontrar tudo aquilo que perdeu achando que, ao lhe encontrar, não mais precisaria de nada. E ela jamais esteve tão apegada ao presente, jamais esteve tão alerta, tão atenta, tão sedenta pela luz do sol e, principalmente, por essa não-luz da noite. O tempo havia fechado completamente, já não havia mais sol. E eis que todos os sentimentos ruins de se guardar, toda a angustia e a tristeza, sublimaram, evaporaram e acabaram por contaminar a chuva. No entanto, tudo isso que ela deixou escapar de suas mãos, está, agora, no ar. Cobre a tua cabeça, pois a chuva será forte, será intensa, e será ácida.

Querida desconhecida.

Enxergo em você uma imensa esperança que não sabia onde estava há muito tempo. E me pergunto: como se pode amar alguém que nunca conheceu? Sei muito sobre você. Poucas palavras podem ter muito significado sabia? Também podem alimentar o sonho de um novo amor, nova vida.

Sonho em fugir para longe, bem longe, com você. Para onde? Não sei. Em ti coloco todas as minhas frustrações. Imagino que com ela tudo será perfeito e eterno. Imagino seu beijo, me imagino na sua cama. Não nos falamos muito, mas nesse pouco tempo faço questão de observá-la. Analiso todos os pedacinhos de você, de pés a cabeça. Me apaixonei por uma estranha e essa paixão me move. Nunca tinha entendido o amor platônico, mas agora cá está ele, querendo tirar onda da minha cara. O pior é que eu quero ver onde isso vai dar. Não que queira te conhecer mais. Mas quero ter você nos meus pensamentos todos os dias, quero fantasiar você aqui quando o tédio estiver perto.

Minha querida desconhecida, não deixe que eu te conheça melhor. Não quero enxergar seus defeitos, não quero me cansar da sua companhia, nem sequer imaginar reprovar os seus atos. Se for amar, ame de longe e poderemos viver felizes com o pensamento de um dia tudo ser real.


"O destino é o que baralha as cartas, mas nós somos os que jogamos".

Shakespeare.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Eles resolveram mudar.

Bom, ela prometeu que jamais esqueceria a toalha molhada na cama de novo, não deixaria a louça acumular, e tudo que abrisse, fecharia.
Ele prometeu diminuir a bebida, ouvir Metallica mais baixo e só encontraria os amigos com o consentimento dela.
Ela jurou que não o chamaria de novo pra ir à missa, que diminuiria as conversas ao telefone e que não se atrasaria.
Ele jurou ouvi-la com mais atenção, não discutir política com o sogrão e não arrotar durante as refeições.
Ela disse que não iria mais rir tão alto, que compraria sapatos mais baratos, se era isso que ele queria.
Ele falou que dirigiria com mais cautela, que esqueceria o futebol e voltaria a caminhar.

Um belo dia, eles se olharam e perceberam que não havia mais nada a pedir. Ainda mais que isso, que já não reconheciam nem ao outro, nem a si. Após muitas interrogações, afirmações e exclamações, sobrou apenas uma duvida: cadê a pessoa com quem me casei?

"Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro."
Clarice Lispector